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Série "Contexto" analisa o enigma dos buracos negros

A complexidade científica se dá pelo fato de as leis da físicas que acreditamos ser universais, não se aplicarem nessas regiões

Se você leu nossa reportagem sobre mudanças climáticas, é provável que tenha questionado os possíveis rumos para a humanidade, considerando que, com o aumento da temperatura média do planeta, os fenômenos extremos da natureza podem se tornar cada vez mais recorrentes, fazendo da Terra um lugar inóspito para a sobrevivência humana. A hipótese já foi considerada no cinema, com a ficção científica "Interestelar", dirigida pelo cineasta Christopher Nolan, que buscou na ciência os recursos para torná-la verossímil. Mas neste quesito será que a vida imita a arte? Na editoria contexto dessa semana, o professor Bruno Gonçalves, no Núcleo de Física, faz uma análise sobre essa realidade. 

Teorias e hipóteses acerca da física quântica, astronomia e cosmologia foram abordadas na ficção, retratando com realismo fenômenos como a dilatação do tempo e os buracos negros, regiões que apesar de enigmáticas, são alvos de muitas teorias que estão sendo confirmadas nas últimas décadas. Apesar da complexidade do tema estar sendo cada vez mais dissolvida, muitas dúvidas ficam no ar. Afinal, o que é um buraco negro? 

Buraco negro é uma região do espaço-tempo em que o campo gravitacional é tão intenso que, nenhuma partícula ou radiação eletromagnética pode escapar dela. Todos os corpos celestes no universo evoluem no tempo e geram atração gravitacional, mas não necessariamente irão formar buracos negros. Para isto, é preciso que a atração seja tão forte, que o corpo tenha um colapso em uma região pequena em relação à quantidade de massa que ele possui. “Quando este fenômeno é forte o suficiente para que não seja possível haver emissão de energia, dizemos que ali há um buraco negro”, afirma o professor Bruno Gonçalves. 

Do colapso gravitacional, resulta uma região com gravidade tão intensa que nem a luz é capaz de escapar, uma vez que o campo gravitacional “engole” absolutamente tudo. Este apontamento já havia sido feito há um século, por Albert Einstein, com o  cálculo de que a força da gravidade poderia distorcer o espaço-tempo, e que pôde ser constatado com a primeira fotografia de um buraco negro (M87), registrada no dia 10 de abril de 2019, feito único, já que é impossível fotografar algo que não emite e nem pode refletir a luz. Portanto, o que vimos na verdade é a luz que está ao redor dele, pouco antes de passar o ponto de não retorno.

Os processos que ocorrem dentro de um buraco negro são extremos, portanto, ainda não é possível fazer uma descrição abrangente do que ocorre dentro dessa região chamada de “horizonte de eventos”, na qual não se aplicam as leis da físicas que acreditamos ser universais. Apesar do fenômeno ser um dos mais enigmáticos do universo, após 50 anos, a previsão do físico Stephen Hawking pôde ser observada. O teorema prevê que a área total do horizonte de eventos nunca deve diminuir e, em seu centro, o tempo e o espaço param. 

A preposição também aponta que buracos negros têm entropia, grandeza que mede o nível de desordem de um sistema, além de emitir radiação em escalas de tempo muito longas. O teorema havia sido provado matematicamente, mas, só em 2015 pôde ser visualizado na natureza, após a análise da onda gravitacional GW15914, formada pela fusão de dois buracos negros que geraram um novo, concentrando uma quantidade de energia ainda maior. Apesar da recém descoberta, ainda não é possível fazer a medição da radiação Hawking até o momento, além de não possuir generalidade na comunidade científica. 

Descobertas como essa, possibilitam conhecer as leis gerais da natureza e os processos que são verificados através delas. Bruno afirma que descobertas ligadas à física de altas energias não ocasionam impacto imediato na sociedade. “É um desenvolvimento que, de forma geral, gera tecnologias depois de muitas décadas. Esse tipo de descoberta gera mais conhecimento básico a partir do qual se pode construir uma aplicação”. 

É o caso do efeito fotoelétrico e antipartículas, descoberto há mais de cem anos e que hoje nos permite usar sensores de presença e fazer exames com imagens de alta precisão para auxiliar no diagnóstico de doenças. “O ‘P’, do PET-SCAN, significa pósitron, a antipartícula do elétron, prevista teoricamente sem nenhuma aplicação prevista na época”. Não é possível prever o que uma descoberta tão importante quanto a possibilidade de explicação de comportamento de buracos negros pode gerar de ganho para nossa sociedade, mas o que sabemos é que ainda há muito a ser descoberto e a ciência continuará a nos surpreender.

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