Ensino
Contexto: Paradoxo da amizade indica que temos menos amigos que nossos amigos
Em 1991, o sociólogo Scott L. Feld publicou um artigo no American Journal of Sociology que observava um fenômeno curioso: em média, a maioria das pessoas tem menos amigos que seus amigos. Por mais que soe como uma afirmação estranha ou difícil de ser comprovada, mais recentemente, um estudo realizado pelo Facebook com seus usuários constatou que, de fato, a teoria que ficou conhecida como Paradoxo da Amizade tem algum fundamento. Para entender melhor o assunto e verificar se as coisas são mesmo como parecem, convidamos o professor do Núcleo de Matemática do Campus Juiz de Fora, Átila Jones, que discute alguns dos conceitos por trás dessa afirmação.
Na época em que o estudo foi conduzido, o Facebook contava com 721 milhões de usuários, que formavam um total de 69 bilhões de amizades na plataforma. Após as devidas análises, foi verificado que um usuário típico da rede possuía, em média, 190 amigos, enquanto seus amigos tinham um número muito superior de amizades, numa média de 635. Ou seja, para 93% das pessoas, o número de amigos em seu perfil era menor que o número médio dos amigos de seus amigos.
Mas isso não quer dizer que somos menos populares ou temos mais dificuldades em fazer amigos, é simplesmente um fenômeno matemático. Essa teoria é definida como um paradoxo pois compõe uma afirmação, inicialmente verdadeira, que nos leva a uma contradição lógica. Átila nos explica que, na matemática, também há paradoxos que envolvem conceitos e grandezas específicas, neste caso, por exemplo, cálculos de média.
“No caso do estudo do Facebook, temos uma sequência de fatos lógicos verdadeiros que nos leva a concluir algo não intuitivo. O fato de termos menos amigos que o número médio de amizades dos nossos próprios amigos nos causa estranheza, pois nossos amigos podem fazer a mesma declaração e termos então uma sensação de contradição.” Ele coloca que devemos observar que a construção do paradoxo é feita usando a média ponderada, o que faz com que a contagem seja focada no ponto da visão dos envolvidos."
Considerando uma coleção de números, a média simples, que é mais usada em nosso dia a dia, seria a medida estatística que representa a soma de todos os valores dividida pelo número de elementos presentes nesse grupo. Já na média ponderada, cada um dos valores possui uma importância ou peso diferente, de modo que antes de somar todos os valores, deve-se multiplicar o peso de cada um deles e, então, dividir pela soma de todos esses pesos. Parece complexo, né? Mas fizemos um vídeo que pode ilustrar isso de maneira mais didática.
O tipo de cálculo usado na teoria é diferente do cálculo de média que estamos acostumados a fazer cotidianamente, por isso a afirmação nos causa espanto. Mas se pararmos para perceber, a maior parte das pessoas têm apenas conhecidos ou pessoas próximas adicionadas, enquanto um número menor de pessoas tem muitos perfis adicionados. Essas pessoas com muitos amigos aumentam significativamente a média total, o que cria a aparência de termos menos amigos que nossos amigos.
Essa observação tem caráter mais lúdico e de curiosidade. Mas o mesmo tipo de raciocínio pode ser aplicado em relações pessoais para identificar possíveis contaminados em surtos de doenças infecciosas, por exemplo. Para o professor Átila Jones, é importante ter em mente que a matemática não é baseada simplesmente em fazer contas, mas em ideias e teorias que estão sendo desenvolvidas até hoje e que ajudaram a proporcionar uma infinidade de avanços na humanidade. Com isso, ele ressalta a importância do estudo e da especialização na área e de um ensino que desperte mais a atenção dos estudantes para as diferentes possibilidades que ela traz.
“Certamente, a matemática se torna mais atraente quando apresentada de forma contextualizada e com recursos que facilitam o ensino, motivando a formação de novos profissionais que podem trabalhar na própria evolução da matemática, ou na sua aplicação junto a outras áreas para desenvolvimento de tecnologias e soluções de problemas”, conclui Átila.