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VII ERAS e VII ENNEABI: Feira Afroempreendedora abre espaço para produtos e troca de experiências étnicas
Quem passou pelo lounge instalado no campus São João del-Rei do IF Sudeste MG, na última semana, não pôde seguir adiante sem dar uma parada para conferir os produtos da Feira Afroempreendedora. Foi mais uma iniciativa de sucesso dentro da programação da sétima edição do Encontro Nacional de Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros (Neab), Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Neabi) e grupos correlatos da Rede Federal de Educação Profissional Tecnológica (Enneabi), sediada pelo campus no período de 14 a 16 de setembro.
Em meio a conversas com diversos sotaques, roupas e pinturas coloridas e muito papo importante dentro do universo político-educacional-social brasileiro, o público pôde também admirar e adquirir os trabalhos colocados à venda pelos participantes no evento. Uma mistura de influências negras, brancas, quilombolas e indígenas em bancas que se espalharam nos arredores da quadra da escola.
Figura marcante na feira, Daisy Cristina Santiago, veio de Barbacena e trouxe para a feira brincos, pulseiras, bolsas customizadas e muita atitude. “Tenho uma empresa com minha irmã e trabalhamos somente com produtos étnicos. É muito gratificante estar aqui e poder mostrar adereços que muita gente não conhece, com referências negras, cores e estampas que remetem a nossa raça”, explica.
O empreendedor Frederico Lopes, de Juiz de Fora, fez questão de mostrar os colares artesanais, feitos com cerâmica, produzidos por sua família. “ Trazemos a religiosidade nas peças apresentadas, mas também produtos que são usados para ornamentação, independente de qualquer coisa. Um evento como o Enneabi enaltece a cultura afro e abre espaço para que nossos produtos sejam vistos por representantes de todo o Brasil. Não só divulgamos a marca, mas representamos a religiosidade africana no evento”, comenta.
Não somente um, mas pelo menos três stands ofereciam produtos de origem indígena. A dificuldade de comunicação em língua portuguesa não foi obstáculo para os estudantes do campus Barra do Corda, do Instituto Federal do Maranhão, interagirem com o público durante a feira. Os indígenas da etnia canela, Marco Partay, Cláudio Cotthkre e Denilson Pecxá, trouxeram cestos e bolsas feitos com fibra do buriti para vender no evento: “Viajamos três dias de ônibus para participar pela primeira vez de um evento como o Enneabi. São muitas atividades e estamos felizes por ter vindo”, completa Marco.
Da esquerda para a direita: Denilson Pecxá, Marco Partay e Claudio Cotthkre
Livros e mais livros com a temática afroindígena ocuparam o stand montado por Vânia Moreira, que fez do evento uma extensão de sua livraria Quilombo Cultural, do Rio de Janeiro. “Temos livros somente com temática racial, de várias editoras que não são muito conhecidas no mercado. As pessoas até se surpreendem com a variedade de títulos sobre os mais diversos assuntos. É muito importante participar deste tipo de evento acadêmico-cultural e poder compartilhar literatura, mas também conhecimentos, experiências. Também dar uma forma alternativa de acesso a conteúdos que não são encontrados em livrarias tradicionais”, destaca.
O evento, que teve como tema “Rede Federal na Encruzilhada: entre resistências e reconstruções”, reuniu pesquisadores, educadores, estudantes e demais interessados na temática da educação para as relações étnico-raciais, alocados nos IFs e nas demais IES – Instituições de Ensino Superior do Brasil, em parceria com os participantes de Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros (Neab), Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Neabi) e grupos correlatos, para a troca de experiências, debates e vivências a cerca de temas inadiáveis no ambiente escolar e nas discussões da política voltada para a Educação brasileira.
Divulgado resultado da seleção para o Preparatório PISM I e II
Estudantes de Direito apresentam trabalho sobre desigualdade social no VII Enneabi
O encontro entre projetos acadêmicos e realidades locais: conheça experiências compartilhadas no VII Enneabi e no VII Eras
A presença de delegações de todas as regiões do país garantiu ao VII Enneabi (Encontro Nacional de Neabs, Neabis e grupos correlatos da Rede Federal) e ao VII Eras (Encontro de Relações Raciais e Sociedade) uma diversidade que enriqueceu as experiências de quem acompanhou as atividades. Um dos aspectos mais fascinantes nos eventos, realizados no Campus São João del-Rei do IF Sudeste MG, foi a conexão entre as realidades locais e os projetos acadêmicos desenvolvidos no contexto da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica.
“Fazemos questão de levar nossos alunos aos eventos. Eles apresentam trabalhos. Tenho alunos hoje doutores, mestres, que estão em outros países. Nossos cursos, além de formar tecnicamente, também se dedicam à formação humana. A Rede Federal muda vidas”, aponta Fábia Holanda de Brito, coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Neabi) do Campus São José de Ribamar do IFMA.
Do Instituto Federal do Maranhão (IFMA), veio a maior delegação participante dos eventos: cerca de 120 pessoas, de vários campi da instituição. Uma delas foi a professora de História Fábia Holanda de Brito, coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Neabi) do Campus São José de Ribamar. Em uma das sessões temáticas do evento, ela apresentou o trabalho “Aquilombados - Eh! Boi rapaziada: festa de São Marçal, território do Bumba-Meu-Boi”.
A festa de São Marçal é uma manifestação muito tradicional da cultura popular maranhense, que nasce como um ato de resistência e reúne grupos brincantes de bumba-meu-boi. “Os sujeitos citadinos, trabalhadoras e trabalhadores em geral, muitas vezes estão invisíveis nas áreas chamadas 'nobres'. Nas festas, nas brincadeiras populares, eles se tornam visíveis. Isso precisa ser observado pela academia. É importante saber quem são as pessoas, registrar suas narrativas”, comenta a coordenadora local do Neabi.
“Porque ele não é só o sujeito da cidade ou o sujeito brincante. Ele é um todo. Quais políticas públicas estão sendo feitas para atender a essas pessoas? Aos poucos, o universo acadêmico está prestando mais atenção a tudo isso. É a partir da luta dessas pessoas que acontecem as conquistas”, acrescenta a pesquisadora, que valoriza a oportunidade de encontros nacionais como o Enneabi.
“Fazemos questão de levar nossos alunos aos eventos. Eles apresentam trabalhos. Tenho alunos hoje doutores, mestres, que estão em outros países. Nossos cursos, além de formar tecnicamente, também se dedicam à formação humana. A Rede Federal muda vidas”, completa.
A aluna e pesquisadora Yhanna Beatriz Nunes, do 2º ano do curso técnico em Agenciamento de Viagem integrado ao Ensino Médio do Campus Barreirinhas, fez parte da delegação do IFMA, que viajou durante três dias de ônibus até São João del-Rei. Para ela, uma jornada que vale a pena, uma oportunidade de trocar experiências e compartilhar os resultados de um projeto desenvolvido junto à comunidade quilombola Santo Antônio, em Barreirinhas.
“É extremamente gratificante. Todas as vezes que vou à comunidade, volto com novas experiências. Há muitas comunidades quilombolas em Barreirinhas. Estamos também trabalhando para ajudar no fortalecimento dessas raízes e desses laços. Eu me encantei com esse trabalho e pretendo continuar”, conta a estudante, que iniciou o contato com o quilombo Santo Antônio a partir de um trabalho proposto pelo Neabi do Campus Barreirinhas no contexto do Dia da Consciência Negra.
Tribos Yanomami, o olhar de Claudia Andujar e o Instagram
De origem suíça, a fotógrafa Claudia Andujar se naturalizou brasileira e se transformou, na segunda metade do século passado, em uma grande aliada da defesa dos direitos das tribos Yanomami, uma luta muito presente e necessária até os dias atuais. Os povos originários sempre estiveram presentes nas fotografias de Claudia, que naquela época eram divulgadas a partir de exposições e revistas.
“E se os povos da floresta tivessem Instagram?”. A pergunta formulada pelo professor Paulo Nascimento e os estudantes do curso técnico em Informática integrado Anne Asan, Nataly Bilhar e Miguel Fragoso, do Campus Iranduba do Instituto Federal do Amazonas (Ifam), também deu título ao projeto apresentado por eles no primeiro dia do VII Enneabi. A ideia foi levar a banners impressos uma exposição de fotos de Andujar no layout de postagens na rede social.
Responsável pela parte visual do projeto, Anne explica que “foram selecionadas as fotos mais marcantes de Claudia que estão no arquivo do Instituto Moreira Salles”. Para Miguel, a ação também é uma forma de chamar atenção para o ativismo de Andujar, e não apenas para as fotografias propriamente ditas. “A grande maioria das fotos que utilizamos de Claudia Andujar é de tribos Yanomami. Ela retratou muito os povos indígenas, especialmente no estado do Amazonas. Ela também lutou muito pela defesa dos direitos do povo Yanomami”, contextualiza o estudante.
No segundo dia do Enneabi, professor e estudantes apresentaram, para este mesmo trabalho, imagens registradas na Amazônia no século XIX pelo fotógrafo alemão Albert Frisch.
Nota de pesar
Oficinas oferecem capacitação e reflexões a participantes do VII Enneabi e do VII Eras
Quem participa de eventos como o VII Enneabi (Encontro Nacional de Neabs, Neabis e grupos correlatos da Rede Federal) e o VII Eras (Encontro de Relações Raciais e Sociedade), nunca é a mesma pessoa quando volta para casa. Esse processo acontece não apenas pelo intercâmbio entre representantes de todas as regiões do país, mas também pela chance de se capacitar e de compreender melhor determinadas dinâmicas. As oficinas e os minicursos realizados nas manhãs de quinta e sexta-feira, 14 e 15 de setembro, no Campus São João del-Rei do IF Sudeste MG cumpriram este papel com excelência.
Uma das salas mais cheias do evento foi a reservada à “Oficina de promoção da igualdade racial e enfrentamento ao racismo: as cotas raciais e as bancas de heteroidentificação no serviço público e na educação”. As bancas de heteroidentificação são um instrumento complementar à autodeclaração que, no âmbito das instituições públicas, ajudam a garantir que o acesso às vagas correspondentes às políticas de cotas raciais aconteça conforme previsto pela legislação.
Ministrante da oficina, o pró-reitor adjunto de graduação da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), Adilson Pereira dos Santos, reforçou a importância das bancas e de sua capacitação. “A participação das pessoas (na oficina) é de fundamental importância. Com o advento das comissões de heteroidentificação, esses grupos acabaram se tornando os guardiães da execução adequada da Lei de Cotas, que tem como objetivo aumentar a presença de pessoas pretas, pardas e indígenas tanto nos Institutos Federais quanto em universidades”, contextualiza.
Identidade racial
Identidade racial foi o tema central da oficina “Enegre(ser) as relações: o Eu, o Outro e o Nós”, ministrada pela aluna Hellen Mariano Roberto, do curso técnico em Multimídia do Campus Avançado Cataguases do IF Sudeste MG. Também professora dos anos iniciais do Ensino Fundamental em Cataguases, Hellen promoveu uma dinâmica que levou os participantes da oficina a reflexões sobre identidades.
"A proposta foi trazer recortes de como o processo de tornar-se negro é gradativo, algo construído desde a infância até a vida adulta. Nós pedimos para os participantes fazerem um autorretrato, para trabalhar essa questão da identidade racial e perceber como as pessoas se portam em relação a essa autoaceitação”, detalha. Também proponho esse trabalho de identidade racial com crianças em uma escola estadual em Cataguases. Numa sociedade racista e miscigenada, é importante que a gente compreenda esses processos, até para se reerguer e não aceitar manifestações veladas de racismo. É fundamental o reconhecimento como parte da negritude, um grupo que, embora grande, é considerado minoria (no contexto da nossa sociedade). É um grupo em constante ascensão em relação à militância e ao seu empoderamento”, enfatiza.
“Por me identificar como uma pessoa branca, nunca vou sentir o que é ser vítima de um episódio de racismo. Estando no Neabi, entendo que consigo contribuir mais quando escuto relatos e participo de eventos, para tentar ajudar a fazer a diferença com ações que sejam importantes para a nossa unidade”, comenta a servidora Vívian Cavalcanti .
A servidora Vívian Cavalcanti, uma das integrantes da oficina, relata que o encontro foi mais uma experiência valiosa para enriquecer o trabalho realizado pelo Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Neabi) do Campus Santos Dumont do IF Sudeste MG, órgão do qual é secretária.
“Por me identificar como uma pessoa branca, nunca vou sentir o que é ser vítima de um episódio de racismo. Estando no Neabi, entendo que consigo contribuir mais quando escuto relatos e participo de eventos, para tentar ajudar a fazer a diferença com ações que sejam importantes para a nossa unidade”, comenta a técnica em Edificações.